sexta-feira, 31 de maio de 2013

A mulher Holmes Place

O principal problema eram os seus repentes.

Por exemplo se, de repente, lhe desse para sair dali, era capaz de deixar tudo para trás: o plano, o livro, a música, a conversa; desaparecia, voava, como se não houvesse amanhã, como se tivesse que acontecer tudo nesse dia, como se obedecesse a uma qualquer força dentro dela que a obrigava a ir. Ela era simplesmente o verbo ir. Não havia como prendê-la e ele sabia disso. Nesses primeiros meses de encantamento, era precisamente esse o ingrediente principal que nutria aquela paixão: a sua forma inesperada de ser; o impulso de criança que a levava a chapinhar no lago do jardim onde passeavam; os seus ímpetos de afecto que a faziam percorrer os quilómetros que fossem precisos só para o ver – surpresa!; os súbitos convites para almoçar, lanchar, jantar, cear – surpresa, surpresa, surpresa!.
Ele sempre soube que ela era assim. Afinal, no dia em que se deixou apaixonar, tinha gostado tanto dela quanto dos seus repentes. Foi na sua primeira aula de RPM, no Holmes Place. Que belo prenúncio – pensava agora.
Pegou no folheto do ginásio, lembrança do destino que o tinha levado até ela e que, desde então, guardava na gaveta. Desdobrou-o e leu: ‘sem criar risco de lesões, o RPM é um exercício sem impacto, divertido que lhe irá criar uma fantástica sensação de bem estar’. Sim, sim, sim, sem impacto hoje, divertido agora, com uma fantástica sensação de bem estar de repente… hoje, agora, de repente...

Foi então que, no impulso mais prudente do mundo, decidiu pô-la a andar em dois segundos. Surpresa!
 
 Imagem retirada do filme To The Wonder de Terrence Malick


 

2 comentários:

Maria disse...

CINCO estrelas!

Kika disse...

Nada contra os excelentíssimos utilizadores do referido ginásio ;)
Um beijinho grande querida Maria